quarta-feira, 20 de abril de 2011

segunda-feira, 18 de abril de 2011

O Descompasso da Conquista


Flávio Gikovate - Novembro/1999

Costumamos dizer que o homem é menos romântico e mais conquistador, caçador. Por outro lado, pensamos nas mulheres como criaturas mais interessadas em relações amorosas duradouras, que possam levar a vínculos estáveis, matrimoniais. Será verdade? Acredito que sim, mas penso que temos de entender melhor essas diferenças entre os sexos.

Um pouco tem a ver com a biologia e outro tanto está ligado a nossa educação. O que não adianta é insistirmos na idéia da igualdade, já que não é assim – ao menos por enquanto. Precisamos nos esforçar para evoluir, mas não podemos negar nossa maneira atual de ser nem subestimar as dificuldades e a demora nas mudanças de comportamento.
Na cabeça do homem, a aventura da conquista tem um caráter essencialmente sexual e está profundamente relacionada com a vaidade. Todos nós lembramos com mágoa os primeiros anos da adolescência, quando nos sentíamos fortemente atraídos pelas mulheres e elas não nos davam bola. Durante anos alimentamos fantasias de que um dia as coisas seriam diferentes. Haveria um tempo em que teríamos sucesso profissional, econômico, intelectual e social – e por causa disso elas iriam prestar mais atenção em nós.

Viramos adultos, aprendemos muita coisa e nos aprimoramos na arte da cantada. À medida que conseguimos êxito, partimos para outras tentativas. Vamos das situações mais simples e mais fáceis às mais complicadas, isto é, para a abordagem das mulheres que parecem ser as mais atraentes e difíceis. Tudo se torna então um jogo de auto-afirmação, cujo alvo é neutralizar o sentimento de inferioridade que acumulamos na puberdade.

A conquista e a intimidade sexual, além de prazerosas, nos fazem sentir vencedores. Depois que esse objetivo é alcançado, a regra geral é que a mulher deixe de ser desejada: o jogo terminou e a alternativa agora é rumar para outra aventura, se possível mais difícil e mais trabalhosa. O ego dos homens se infla com essas experiências e a questão amorosa só surge por acaso, quando a mulher o impressiona particularmente.
Acredito que, mesmo sem clara consciência, as mulheres intuem que é assim que funciona a cabeça dos homens. Por isso sempre tentam prolongar o tempo do flerte e donamoro, tornando difícil a intimidade sexual. A vaidade feminina se satisfaz mais fácil e rapidamente que a masculina. Ser paquerada na rua já é massagem para o ego e isso não existe na vida dos homens (ah, como adoraríamos que elas também mexessem conosco!).


A própria insistência masculina durante esse período faz muito bem à alma feminina, pois na fase da conquista os homens são muito cordiais, atenciosos e as tratam como se tivessem visto nelas tudo o que sonharam numa mulher. Sendo assim, e como elas temem que a relação sexual seja o início do fim do relacionamento – e isso corresponde à realidade, ao menos na maior parte das vezes –, existe uma tendência para o prolongamento máximo dessa fase.

Devido ao fato de que, no início, o homem se posiciona como criatura adorável, satisfazendo todos os caprichos da sua eleita, o que acaba acontecendo é que ela se apega emocionalmente a ele. Começa a desenvolver sentimentos de ternura e passa a sonhar com uma ligação mais estável. Ao falar sobre isso, o homem diz que o mesmo ocorre com ele, pois não quer perder pontos diante de sua "presa".


Acontece que a mulher está falando a verdade e ele não – é regra geral. Quando finalmente se dá a intimidade sexual, ele se sente vitorioso e tende a perder todo o interesse. A mulher, até mesmo por força da educação milenar ainda presente em nossa geração, envolve-se mais ainda. Está assim composto o dilema que acaba por determinar um forte sofrimento para a mulher, o que agrava ainda mais a fama que o homem tem de aproveitador romântico.

Está Chegando a Era da Passividade Masculina


Flávio Gikovate - Abril/2001

Temos sido atropelados pelas novidades tecnológicas e também pelas mudanças nos costumes. Antigamente, havia os grupos minoritários, os precursores, quase sempre constituídos por artistas plásticos, músicos e intelectuais. Hoje a situação se inverteu, de modo que nós – os que deveríamos estar propondo as inovações – temos tido de correr para explicar os fatos que já aconteceram.

Assim, não fomos nós, os profissionais de psicologia com bons conhecimentos em questões sexuais, os que introduziram o conceito de “ficar”. Foram os meninos e as meninas de 13 e 14 anos os que inventaram a moda. Só fomos informados de que nossos filhos “ficavam” alguns anos depois. Ficamos horrorizados e hoje achamos tudo muito natural. Este episódio do “ficar” me mostrou que não éramos mais da “comissão de frente” e que os fatos culturais estavam andando mais depressa que nossos pensamentos e idéias.

Estamos diante de mais uma grande inovação, de uma conduta que está começando a se disseminar. Não acho bom que fiquemos, outra vez, por fora dos acontecimentos e que sejamos tão surpreendidos pelo que vem aí. A novidade, aparentemente simples, é a de que cresce o número de meninos entre 16 e 18 anos de idade que não correm atrás das moças. Os pais se assustam, não sabem o que está acontecendo, pensam que seus filhos possam estar padecendo de algum problema sexual mais grave ou que estejam vivendo algum sério conflito emocional. Estes moços são caseiros, interessados em esportes ou assíduos freqüentadores da Internet, gostam de televisão, de conviver com os amigos e não parecem aflitos em encontrar namoradas ou mesmo parceiras sexuais.

Isto é muito diferente do que acontecia no passado, quando os rapazes se dedicavam de corpo e alma à paquera e ao jogo da conquista erótica. Muitos se sentiam fracassados nesta empreitada, mas todos queriam aprender a arte de melhor seduzir as melhores. Muitos rapazes se tornaram ambiciosos e determinados na busca de algum tipo de destaque, entre outros motivos, para reverterem a posição ruim que tinham em relação às garotas: desejavam-nas muito e percebiam que elas se interessavam mais por rapazes mais velhos, destacados nos esportes, que já estivessem na faculdade, que tivessem carro... Estes moços que não correm atrás das meninas também não costumam dar sinais de grande ambição, de modo que não são os que mais se esforçam em suas atividades estudantis ou mesmo nas de outra natureza. Parece, aos seus pais, que são preguiçosos ou menos inteligentes. Mas penso que são os precursores de uma nova fase.
Pode ser que eu me engane, mas tenho conhecido vários desses moços e reconheço neles uma inteligência até acima da média. São criaturas de muito boa índole, dóceis e de bom humor. Não dão sinal de nenhum tipo de desajuste mental mais grave. Só não querem se apressar nesta corrida frenética na direção das moças, do trabalho e da competição. Dizem frases como “não é necessário se precipitar, as coisas vão acontecer naturalmente, sem pressa.” E o incrível é que parecem não ter pressa mesmo. Não fazem questão de conhecer os caminhos da prostituição, antes tão atraente para os jovens; não se interessam por este tipo de prática sexual. Estes moços se masturbam e parece que isto lhes tira toda a pressa até mesmo de buscarem uma namorada. É como se tivessem descoberto que existe um forte desejo sexual que os impele na direção das mulheres, mas que este desejo se esvai quando ele ejacula – isto graças è existência de um período refratário, de desinteresse sexual, que vem depois do prazer.

Sabemos que a indústria do erotismo e da pornografia produz farto e interessante material para a masturbação masculina. Não que isto subtraia o interesse pela pratica sexual. Tira, porém, a pressa. O que acontece? Como as moças não costumam obter satisfação igual deste material erótico, satisfazendo-se muito mais pelo jogo no qual são o objeto dos rapazes, ficam sujeitas a uma frustração inesperada. O que fazem? Passam a ter condutas ativas na direção dos rapazes, e o fazem de uma maneira nova, diferente daquela que até hoje conhecíamos.

Não é que finalmente as mulheres puderam dar vazão ao seu desejo visual, como pode parecer inicialmente. Os moços descobriram que podem ter desejo visual, e nem por isso têm de exercê-lo pela paquera ativa. Podem se masturbar e se livrar do desejo. As moças têm descoberto que, apesar de não terem o desejo visual, ainda assim podem ter posturas ativas em relação aos rapazes.

Vai ficando cada vez mais claro que os moços estão se tornando mais independentes das moças do que elas deles. Este tipo de poder está mudando de lado, favorecendo, talvez pela primeira vez, os homens. Não se trata de um evento de conseqüências limitadas. Não se trata de um modismo e nem de algo menor. Trata-se de uma alteração num dos pilares da nossa história cultural: os homens, que sempre foram fascinados e rendidos pelos encantos femininos, em breve não serão mais os mesmos. Se os homens não forem os mesmos, as mulheres também não serão mais as mesmas. E a sociedade que nos contém também não será mais a mesma.

A Mulher está mesmo sempre receptiva para o Sexo?


Flávio Gikovate - Março/2001

Tenho um pouco de medo das comparações que costumamos fazer entre o que observamos em outros animais e em nós. As semelhanças existem, é claro. Acho, porém, que devemos dar maior ênfase às diferenças, pois são elas que definem cada espécie. Assim, costuma-se dizer que as mulheres, dferentemente de outras fêmeas, vivem num cio permanente. Vamos refletir um pouco sobre esta questão palpitante.

As fêmeas dos mamíferos superiores entram no cio quando estão ovulando, ou seja, quando estão disponíveis para a fecundação. O subproduto de hormônios femininos fazem surgir odores especiais na urina delas; estes são captados pelos machos daquela espécie. Ao dectarem o cheiro peculiar ficam excitados e partem em disparada na direção daquela fêmea que o está exalando. Disputam com outros machos a primazia da cópula que, ao ocorrer, dá início ao processo que interrompe o ciclo reprodutor da fêmea. Assim, percebemos que as fêmeas das outras espécies estão disponíveis e atraem os machos apenas durante o período de fertilidade, ou seja, durante o cio.

Nas comparações que fazemos ao estudarmos o tema em nossa espécie, fica claro que as mulheres atraem os homens durante todo o ciclo menstrual, inclusive durante a menstruação. Se analisamos o caso do ponto de vista do desejo que elas despertam nos homens, podemos pensar que vivem um cio constante, visto que as outras fêmeas só atraem os machos durante esse período específico. Este seria um modo muito incompleto de analisar a questão, além de me parecer um tanto curioso tentarmos pensar sobre o que acontece com uma mulher apenas por aquilo que ela desperta nos homens. Dizer que a mulher vive no cio me parece uma visão masculina e, até certo ponto, machista.
Temos que nos ater ao outro lado da questão, que é o que acontece com a mulher. O fato de o desejo sexual, na nossa espécie, ser intermediado basicamente pela visão faz com que a mulher apareça como interessante sexualmente ao olhos dos homens o tempo todo. Isto não quer dizer que ela se sinta disponível para a intimidade sexual durante todos os dias do mês. E mais: mesmo se pode ter relações a qualquer tempo, não quer dizer que não existam dias do ciclo nos quais se sinta mais excitada. Não é mesmo impossível que estes dias de maior disponibilidade coincidam com aqueles da ovulação. Uma coisa é a mulher despertar o desejo do homem o tempo todo e outra coisa é ela estar o tempo todo com a mesma disposição para o sexo.

Insisto em que isto não nos permite nenhuma conclusão a respeito do que as mulheres sentem a respeito do assunto. Como a norma tradicional e nossa cultura sempre foi a de que cabe os homens a iniciativa sexual, sendo que até há pouco tempo não era dado à mulher o direito de recusa, é claro que nunca se questionou com seriedade o que, de fato, acontece com ela.

Não é impossível que muitas mulheres vivenciaram sentimentos de incopetência sexual por não estarem sempre com um desejo equivalente ao que despertavam em seus companheiros. É claro que muitos homens se sentiram rejeitados injustificadamente porque não encontraram mulheres disponíveis para eles – para o sexo e não para eles – exatamente naqueles dias em que elas tanto os provocavam e excitavam por sua aparência sensual com maior facilidade porque a dependência prática que se estabelece é muito menor. Inteiros que se aproximam e se amam não se sentem donos do outro pelo simples fato de os amarem. Não existem os direitos de mandar e desmandar no outro apenas porque há o elo amoroso. Inteiros que se sentem insatisfeitos podem ir embora. Esta é a novidade maior, pois não há mais lugar para abusos e dominações.

Assim, sem que tenhamos percebido, a capacidade de conceder que caracteriza as pessoas generosas tem diminuído em virtude de elas poderem ficar melhor consigo mesmas. Passam a pretender parceiros mais delicados, mais preocupados com o direito delas, menos egoístas. Assim, egoísmo e generosidade estão saindo da moda. Sim, porque se o generoso quer que se preste atenção nele e nos seus desejos de ser generoso e está se encaminhando na direção do senso de justiça. Com isto ao haverá mais lugar para o egoísmo que só existe porque há generosidade. O que tem acontecido? Inteiros se aproximam, se “curtem” , estabelecem elos onde há preocupação permanente em agradar o outro ao mesmo tempo que não abrem mãos de seus direitos individuais. A palavra-chave desta nova e mais sofisticada forma de amar é a mesma que sempre e existiu nas amizades: respeito.

Os opostos se atraem, mas não se entendem

Os opostos se atraem, mas não se entendem
Flávio Gikovate- Março/1993

É voz corrente, que nos relacionamentos afetivos, os opostos se atraem. Diante do fato, a gente se posiciona de forma curiosa: como sempre ouvimos falar disso, consideramos a afirmação absolutamente verdadeira. Não duvidar de sua lógica parece nos conduzir a um “porto seguro” e acabamos acreditando que o fenômeno é inevitável.

Por acaso alguém já se questionou a respeito? Afinal de contas por que os opostos se atraem? Trata-se de uma fatalidade, de uma lei da natureza que nos leva a bons resultados? Acho muito importante assumir uma atitude crítica e de reflexão em torno dos problemas do amor, pois é a emoção que mais dor e sofrimento nos tem causado. São raras as pessoas realmente felizes e realizadas nessa área.


Devem existir muitos erros e ignorância em relação ao amor. Aliás, é só de algumas décadas para cá que os profissionais de psicologia – e, ainda hoje, poucos entre eles – começaram a se interessar pelo assunto, até então reservado aos poetas.

Gostaria de externar de modo categórico a minha opinião, fundamentada em mais de 26 anos de experiência como psicoterapeuta: os opostos se atraem, mas nem por isso combinam bem.

O resultado desse tipo de união não é obrigatoriamente um sucesso. Pessoas muito diferentes vivem brigando e se irritando uma com as outras.

Temperamentos e gostos antagônicos dificultam a vida em comum. Durante o período de namoro, os obstáculos existem, mas não são tão importantes, uma vez que são raras as coisas práticas compartilhadas.

Após o casamento, porém, as divergências infernizam o cotidiano. Como encaminhar a educação dos filhos se os pontos de vista são tão diferentes? Como planejar a economia doméstica, a ordem dentro de casa, as viagens de férias?

Na prática, ocorre o seguinte: os opostos se atraem, mas na rotina da vida em comum as contradições se acirram. Começa então a tarefa de cada um tentar modificar o outro.

O marido quer moldar a mulher de acordo com o seu modo de ser; a mulher deseja que o marido a compreenda e se aproxime dos seus pontos de vista.

Será que isso é possível? Não deveriam diminuir as diferenças com o convívio?

Deveriam, mas não diminuem, talvez por causa do medo de ver o encantamento amoroso desaparecer. Sim, porque afinal de contas os namorados se sentiram atraídos exatamente por serem pólos opostos. Se ficarem parecidos, não acabará o amor?

Os casais convivem por anos, sempre se desentendendo, sempre procurando fazer do outro um semelhante e só conseguem agravar as diferenças e piorar as brigas.

Não deixa de ser ironia que a gente se sinta fascinado por pessoas com as quais não teremos um bom convívio. Esse fenômeno é responsável por um enorme número de uniões infelizes e que, hoje, acabam em divórcio. Cabe indagar: a atração por opostos é inevitável? Acho que não, apesar de ser muito comum, especialmente na adolescência. Considero fundamental entendermos as razões que levam a esse tipo de encantamento. Conhecendo-as, poderemos evitar o erro e nossas chances de sucesso no amor aumentarão bastante.

A principal causa do magnetismo entre opostos é, sem dúvida alguma, a falta ou diminuição da auto-estima.

Quando não estou satisfeita com o meu modo de ser, procurarei alguém que seja completamente diverso. Se eu for introvertido e tímido, a tendência será me apaixonar por uma pessoa extrovertida e sem inibição. Com o tempo, o que suscitava minha admiração e era uma “qualidade” se tornará fonte de irritação, mas no início ficarei encantado.

Ao “ter” o outro, “tenho” a extroversão que me faltava. Sinto-me mais completo. Tudo muito lógico na teoria. Na prática, as diferenças nos desagradam, dificultam nossas vidas, criam barreiras e resistências cada vez maiores. Elas são responsáveis pelos atritos constantes e pelas brigas “normais” entre marido e mulher. Será que são mesmo normais?

Uma Pessoa Verdadeiramente Forte


Flávio Gikovate - Maio/1999

A gente costuma ouvir que uma pessoa é forte, que tem gênio forte, quando ela reage com grande violência em situações que a desagradam.

Ou seja, a pessoa de temperamento forte só está bem e calma quando tudo acontece exatamente de acordo com a vontade dela. Nos outros casos, sua reação é explosiva e o estouro costuma provocar o medo nas pessoas que a cercam. Talvez essas pessoas sejam responsáveis por chamar o estourado de forte, porque acabam se submetendo à vontade dele.

Ele é forte porque consegue impor sua vontade, quase sempre por conta do medo que as pessoas têm do seu descontrole agressivo e de sua capacidade para fazer escândalo.

Se pensarmos mais profundamente, perceberemos que as pessoas de "gênio forte" conseguem fazer prevalecer seus desejos apenas nas pequenas coisas do cotidiano. Elas decidirão a que restaurante os outros irão; a que filme o grupo irá assistir; se a família vai para a praia no fim de semana e assim por diante.

As coisas verdadeiramente importantes - a saúde delas e a das pessoas com quem convivem; o sucesso ou fracasso nas atividades profissionais, estudos ou investimentos; as variações climáticas e suas tragédias, como inundações, desabamentos e terremotos; a morte de pessoas queridas - não são decididas por nenhum de nós.

O que leva os de "gênio forte" a comportamentos ridículos: berram, esperneiam e blasfemam diante de acontecimentos inexoráveis, e contra os quais nada podemos fazer. Reagem como crianças mimadas que não podem ser contrariadas! Afinal de contas, isso é ser uma pessoa forte?

É claro que não. Querer mandar nos fatos da vida, querer influir em coisas cujo controle nos escapa, não é sinal de força, como também não é sinal de bom senso, sensatez e de uso adequado da inteligência. Talvez fosse muito bom se pudéssemos influir sobre muitas coisas que são essenciais. Mas a verdade é que não podemos. Isso nos deixa inseguros, pois coisas desagradáveis e dolorosas podem acontecer a qualquer momento. E não serão nossos berros que impedirão nossos filhos de serem atropelados, nossos pais de morrerem, nossa cidade de ter enchentes ou desabamentos.

O primeiro sinal de força de um ser humano reside na humildade de saber que não tem controle sobre as coisas que lhe são mais essenciais. Sim, porque este indivíduo aceitou a verdade. E isso não é coisa fácil de fazer, especialmente quando a verdade nos deixa impotentes e vulneráveis.

O segundo sinal, e o mais importante, é a pessoa compreender que ela terá que tolerar toda a dor e todo o sofrimento que o destino lhe impuser. E mais - e este é o terceiro sinal -, terá que tolerar com "classe" e sem escândalos. Não adianta se revoltar. Não adianta blasfemar contra Deus. Ser forte é ter competência para aceitar, administrar e digerir todos os tipos de sofrimento e contrariedade que a vida forçosamente nos determina.

É não tentar ser espertinho nas coisas que são de verdade. As pessoas que não toleram frustrações, dores e contrariedades são as fracas e não as fortes. Fazem muito barulho, gritam, fazem escândalos e ameaçam bater. São barulhentos e não fortes - estas duas palavras não são sinônimos!

O forte é aquele que ousa e se aventura em situações novas, porque tem a convicção íntima de que, se fracassar, terá forças interiores para se recuperar. Ninguém pode ter certeza de que seu empreendimento - sentimental, profissional, social - será bem-sucedido. Temos medo da novidade justamente por causa disso. O fraco não ousará, pois a simples idéia do fracasso já lhe provoca uma dor insuportável.

O forte ousará porque tem a sensação íntima de que é capaz de agüentar o revés.

O forte é aquele que monta no cavalo porque sabe que, se cair, terá forças para se levantar. O fraco encontrará uma desculpa - em geral, acusando uma outra pessoa - para não montar no cavalo. Fará gestos e pose de corajoso, mas, na verdade, é exatamente o contrário. Buscará tantas certezas prévias de que não irá cair do cavalo que, caso chegue a tê-las, o cavalo já terá ido embora há muito tempo.

O forte é o que parece ser o fraco: é quieto, discreto, não grita e é o ousado. Faz o que ninguém esperava que ele fizesse.

Flávio Gikovate- psiquiatra.... amor e paixão

Amor e Paixão
Flávio Gikovate - Fevereiro/2000

Tenho ouvido muitas definições de amor e paixão: "Amor é legal, paixão é doença"; "Paixão é imaturidade, coisa de adolescente, mas amor é sentimento maduro"; "Amor é o que sobra depois que acaba a paixão". Costumo defini-lo como um instinto, separado do sexual, que busca a sua realização por meio do estabelecimento de uma relação estável com outra pessoa. Ou seja, o amor é paz e harmonia ao lado de alguém especial, com o qual voltamos a nos sentir completos – talvez como estivemos um dia, no útero ou no colo de nossas mães. Quanto mais qualidades esse escolhido tem, mais fortes ficam nossos sentimentos por ele. Quanto mais defeitos, mais forças surgirão para nos afastar desta criatura.

Todos nós, ou quase todos, temos o sonho romântico de mergulhar por inteiro numa relação desarmada com outra pessoa e, de uma certa forma, reconstruirmos a simbiose uterina. Ao mesmo tempo morremos de medo desta diluição, desta perda de limites e de individualidade na relação com o outro.

Esse temor não é uma emoção ilógica e covarde. Nossa individualidade fica efetivamente ameaçada na fusão romântica – o medo reflete este perigo real. O que fazem as pessoas? Costumam se encantar por alguém com uma certa quantidade de qualidades – fatores de atração – e também uma certa dose de defeitos – fatores de repulsão. Desse modo se compõe um equilíbrio estável, onde os defeitos são tão necessários quanto as qualidades! Sim, porque eles nos afastam e garantem nossa identidade, nossa individualidade.

A afirmação de que o amor é o que sobra quando acaba a paixão tem sido na seguinte situação: uma pessoa se encanta por outra e fica tão deslumbrada por ela que só vê suas qualidades. A emoção cresce e, com ela, o medo de perder a individualidade. Esta forteemoção se chama paixão. Porém, com o convívio, a pessoa vai deixando de ser tão cega e passa a ver os defeitos do amado. Aí diminui a emoção e o medo da fusão com o outro. Acabou a paixão e sobrou – quando "sobra" – o amor.

Vamos supor agora uma situação diferente. Não é nada incomum que uma pessoa conheça e se encante por outra que efetivamente quase não apresente defeitos (é claro que estou aqui chamando de defeito as coisas que aborrecem, desagradam, irritam e subtraem a confiança da outra pessoa). Surge o encantamento forte e ele tende a crescer cada vez mais, uma vez que não existem problemas para agir como forças contrárias ao amor. O sentimento é fortíssimo e o medo é brutal, porque parece que estamos sendo sugados pela pessoa amada. Isto é paixão: a mistura de um amor de intensidade máxima com um enorme medo. O coração não bate de amor, bate de pavor! Vivemos um estado de alarme, quase de guerra.

Acordamos de madrugada já pensando nisto, não conseguimos nos alimentar e pensamos obsessivamente no amado. Tememos perder nossa individualidade e também o amado que, sabemos, vive pânico igual ao nosso e pode não suportar a ameaça do amor e decidir romper a relação. Na paixão não se suporta ficar junto nem separado! Ao estar junto, falta o ar. Ao se afastar, falta o sentido da vida. Não é à toa que as pessoas se apaixonam mais facilmente quando há obstáculos externos: distância geográficas, pessoas que sejam casadas, etc. Eles garantem um certo espaço de afastamento e, portanto, de exercício da individualidade.

Não é sem razão que a maioria das paixões não se transforma em relação estável. Na ausência de defeitos, o amor não diminui, nem o medo. Este último acaba por predominar e, sob vários pretextos, as pessoas acabam se afastando dos seus amados. Não é sem razão também que a maioria das pessoas se casa com parceiros ricos em defeitos e com os quais se irritam bastante. É para que o sentimento que os une não seja forte o suficiente para perturbar a individualidade. Palavras como imaturidade, doença e outras que se usam para definir a paixão devem, também, ser estendidas para o amor! Ainda temos muito o que aprender sobre este assunto

sexta-feira, 8 de abril de 2011

FISIOLOGIA DA PAIXÃO


O ENCÉFALO, OS NEUROTRANSMISSORES E A PAIXÃO

O chamado diencéfalo ou cérebro primitivo, comum a todos os mamíferos, intervém, através do hipotálamo, no desejo, no interesse sexual e também recolhe as informações que chegam do exterior e dos hormônios, controlando-os e dando as respostas da excitação sexual, ejaculação, sensações de prazer e regulando as respostas emocionais e afetivas no comportamento sexual.

O sistema límbico discrimina e seleciona os estímulos, reconhecendo os sinais de saciedade (estar satisfeito) e inibindo o comportamento sexual.

A nossa sexualidade apresenta-se não apenas em nível dos estímulos (visuais,fantasias ,etc) ,como também na participação muito importante da emoção e sobretudo na aprendizagem. Algumas partes do nosso cérebro relacionam o ambiente e a cultura às nossas respostas sexuais. O resultado pode ter maior ou menor eficácia dando aos parceiros, maior ou menor prazer.

Razão, fantasia, emoção e aprendizagem se misturam em nosso cérebro dando respostas curiosas no dia a dia sexual do ser humano.

Os neurotransmissores cumprem uma função indispensável na ativação do impulso sexual, como por exemplo, quando as carícias e beijos levam a lubrificação vaginal e à ereção peniana.

Os cientistas conhecem a feniletilamina (um dos mais simples neurotransmissores) há cerca de 100 anos, mas só recentemente começaram a associá-la à paixão. Ela é uma molécula natural semelhante à anfetamina e suspeita-se que sua produção no cérebro possa ser desencadeada por eventos tão simples como uma troca de olhares ou um aperto de mãos.

O “affair” da feniletilamina com a paixão teve início com uma teoria proposta pelos médicos Donald F. Klein e Michael Lebowitz, do Instituto Psiquiátrico Estadual de Nova Iorque. Eles sugeriram que o cérebro de uma pessoa apaixonada continha grandes quantidades de feniletilamina, e que esta substância poderia responder, em grande parte, pelas sensações e modificações fisiológicas que experimentamos quando estamos apaixonados.

PAIXÃO X TEMPO

Existe um limite de tempo para homens e mulheres sentirem os arroubos da paixão? Segundo a professora Cindy Hazan, da Universidade Cornell de Nova Iorque, sim. Ela diz: "seres humanos são biologicamente programados para se sentirem apaixonados durante 18 a 30 meses". Ela entrevistou e testou 5.000 pessoas de 37 culturas diferentes e descobriu que a paixão possui um "tempo de vida" longo o suficiente para que o casal se conheça, copule e produza uma criança.


A pesquisadora identificou algumas substâncias responsáveis pelo amor-paixão: dopamina, feniletilamina e ocitocina. Estes produtos químicos são todos relativamente comuns no corpo humano, mas são encontrados juntos apenas durante as fases iniciais do flerte. Ainda assim, com o tempo, o organismo vai se tornando resistente aos seus efeitos - e toda a "loucura" da paixão desvanece gradualmente - a fase de atração não dura para sempre. O casal, então, se vê frente a uma dicotomia: ou se separa ou habitua-se a manifestações mais brandas de amor - companheirismo, afeto e tolerância, e permanece junto. "Isto é especialmente verdadeiro quando filhos estão envolvidos na relação", diz a Dra. Hazan.


Os homens parecem ser mais susceptíveis à ação dessas substâncias. Eles se apaixonam mais rápida e facilmente que as mulheres. E a Dra. Hazan é categórica quanto ao que leva um casal a se apaixonar e reproduzir: "graças à intensidade da ilusão romanceada, achamos que escolhemos nossos parceiros; mas a verdade é conhecida até mesmo pelos zeladores dos zoológicos: a maneira mais confiável de se fazer com que um casal de qualquer espécie reproduza é mantê-los em um mesmo espaço durante algum tempo".

Com base em outras pesquisas desenvolvidas pela Dra. Helen Fisher, antropologista da Universidade Rutgers e autora do livro The Anatomy of Love, pode-se fazer um quadro com as várias manifestações e fases do amor e suas relações com diferentes substâncias químicas no corpo:

Manifestação

Conceito

Substância mais associada

Luxúria

Desejo ardente por sexo

Testosterona (aumento da libido – desejo sexual)

Atração

Amor no estágio de euforia, envolvimento emocional e romance

  • Altos níveis de dopamina e norepinefrina (noradrenalina): ligadas à inconstância, exaltação, euforia, e a falta de sono e de apetite.

  • Baixos níveis de serotonina: tendo em vista a ação da serotonina na diminuição de fatores liberadores de gonadotrofinas pela hipófise, quanto mais serotonina menos hormônio sexual.

Ligação

Atração que evolui para uma relação calma, duradoura e segura.

Ocitocina (associada ao aumento do desejo sexual, orgasmo e bem-estar geral) e vasopressina (ADH), associada à regulação cardiovascular, atuando no controle da pressão sangüínea.

OS SENTIDOS E A PAIXÃO

VISÃO

A visão é, provavelmente, a fonte de estimulação sexual mais importante que existe.

No homem, existem numerosos estímulos visuais envolvidos na atração sexual, que vão muito além da visão dos genitais do sexo oposto. A forma de mover-se, um olhar, um gesto, inclusive a forma de vestir-se, são estímulos que, enquanto potencializam a capacidade de imaginação do ser humano, podem resultar mais atraentes que a contemplação pura e simples de um corpo nu.

Segundo o neurobiólogo James Old, o amor entra pelos olhos.

Imaginemos duas pessoas que não se conhecem e se encontram em uma festa:

è Ambos se olham e imediatamente se avaliam, o que ativa neocórtex, especializado em selecionar e avaliar.

è O primeiro nível de avaliação de ambos será o biológico (tem orelhas, duas pernas etc) e enfim, geneticamente saudável.

è Depois a análise continua por padrões baseados na experiência de cada um: tipos físicos reforçados como positivos pelos pais, amigos e meios de comunicação.

è Simultaneamente se avaliam dentro de seu tempo e cultura: numa sociedade propensa a sucumbir a pragas e escassez de alimentos, mulheres mais cheinhas eram sinônimo de saúde e fortaleza.

Elas são mais seletivas

O neurobiólogo aponta que no caso feminino também existe um fator adicional e mais abstrato: o poder (também ocorrem mudanças com o tempo e cultura)

Segundo o pesquisador, como as mulheres geneticamente têm menos oportunidades para procriar (o número de gametas femininos é menor do que o de espermatozóides), elas buscam no selecionado a capacidade de prover e proteger seus filhos.

AUDIÇÃO

No homem, a aparição da linguagem representa um passo muito mais avançado como meio de solicitação sexual. Em praticamente todas as sociedades humanas, o uso de frases e canções amorosas constitui uma das preliminares mais habituais. Libertado o cérebro da carga social, uma frase erótica, sussurrada ao ouvido, pode resultar tão incitadora quanto um bramido de elefante na imensidão da selva.

De acordo com investigações do Krasnow Institute for Advanced Study of George Mason University, não só as primeiras palavras, mas também os tons de voz deverão responder aos padrões de saúde e genética desejados na escolha do(a) parceiro(a).

TATO: a pele com a qual amamos

A superfície do corpo humano, com aproximadamente dois metros quadrados de extensão é, poderíamos dizer, o maior órgão sexual do homem. Mais do que simplesmente um dos sentidos, o tato é a resultante de muitos ingredientes: sensibilidades superficiais (epidérmicas e dérmicas), profundas - como a proprioceptiva, ligada a movimento -, vontade de explorar e atividade motora, emoções, memória, imaginação.

Existem cerca de cinco milhões de receptores do tato na pele - as pontas dos dedos tem uns 3.000 que enviam impulsos nervosos ao cérebro através da medula. O tato é provavelmente o mais primitivo dos sentidos. É a mais elementar, talvez a mais predominante experiência do ser humano, mesmo naquele que ainda não chegou a nascer. O bebê explora o mundo pelo tato. Assim, descobre onde termina seu corpo e onde começa o mundo exterior. Esse sentido é seu primeiro guia.

Imagem: BEAR, M.F., CONNORS, B.W. & PARADISO, M.A. Neurociências – Desvendando o Sistema Nervoso. Porto Alegre 2ª ed, Artmed Editora, 2002.

O sentido do tato proporciona um contato imediato com os objetos percebidos e, na relação humana, é uma experiência inevitavelmente recíproca: pele contra a pele provoca imediatamente um nível de conhecimento mútuo. Na relação com o outro, não é possível experimentá-la.

Imagem: BEAR, M.F., CONNORS, B.W. & PARADISO, M.A. Neurociências – Desvendando o Sistema Nervoso. Porto Alegre 2ª ed, Artmed Editora, 2002.

Encontramos homens com problemas sexuais que não beijam, não abraçam e nem acariciam sua parceira. Para quê? Pensam eles. Este modelo de comportamento impede que muitos casais desfrutem do prazer que pode proporcionar o simples fato de dar e receber carícias.

A estimulação tátil é uma necessidade básica, tão importante para o desenvolvimento como os alimentos, as roupas, etc.. O contato físico é a forma de comunicação mais íntima e intensa dos seres humanos, segundo alguns estudos, até os mais insignificantes contatos físicos tem notáveis efeitos.

Nós realmente "sentimos com o olho da mente" - Uma região do cérebro envolvida no processamento do sentido da visão é também necessária para o sentido do tato. Resultados da Universidade de Emory, que confirmam o papel do córtex visual na percepção táctil (toque), foram publicados na edição da revista Nature de 06/10/1999.

As conclusões do estudo são relevantes para o entendimento de não apenas como o cérebro normalmente processa a informação sensorial, "mas também como o processamento é alterado em condições como cegueira, surdez ou torpor e, principalmente, para melhoria dos métodos de comunicação em indivíduos que sofrem de tais desordens", de acordo com Krishnankutty Sathian, Ph.D.

Até recentemente, cientistas acreditavam que regiões separadas do cérebro processavam a informação advinda de vários sentidos. Essa idéia está sendo, agora, desafiada. As descobertas recentes de que o córtex visual de deficientes visuais é ativado durante a leitura em Braille não são tão surpreendentes se apreciadas por este contexto. Os resultados obtidos pelo grupo de pesquisa demonstram que uma região do córtex cerebral, associada à visão, é ativada quando os humanos tentam distinguir a orientação através do tato.

Juntamente aos depoimentos subjetivos da imagem visual e a ativação cortical parieto-occiptal associada, as descobertas levam a crer que o processamento visual facilita a discriminação tátil normal de orientação. Isso, provavelmente, está relacionado ao fato de que geralmente confiamos no sistema visual para nos orientarmos.

PALADAR

Desde muito cedo, a boca é a primeira fonte de prazer. Com 16 semanas de vida, além de fazer caretas, levantar as sobrancelhas e coçar a cabeça, as papilas gustativas já estão desenvolvidas. A experiência tem demonstrado que o feto faz careta e para de engolir quando uma gota de substância amarga é colocada no líquido amniótico. Por outro lado, uma substância doce provoca a aceleração dos movimentos de sucção e deglutição.

Aliás, o prazer do paladar continua na fase em que o bebê se amamenta através do mamilo da sua mãe. Daí para frente, o paladar fica cada vez mais apurado.

A boca é uma das partes que compõem o rosto de qualquer pessoa. Quanto a isto, não restam margem para dúvidas. Mas o que se calhar não sabe, é que a zona bocal é a última parte a adquirir todas as formas e recortes finais, embora seja a primeira a sentir as emoções iniciais da vivência.

A língua é a base de todo o paladar e a boca é uma das partes mais sensíveis do corpo e mais versáteis. Umbeijo combina os três sentidos de tato, paladar e olfato. Favorece o aparelho circulatório, aumenta de 70 para 150 os batimentos do coração e beneficia a oxigenação do sangue. Sem esquecer que o beijo estimula a liberação de hormônios que causam bem-estar. Detalhe: na troca de saliva, a boca é invadida por cerca de 250 bactérias, 9 miligramas de água, 18 de substâncias orgânicas, 7 decigramas de albumina, 711 miligramas de materiais gordurosos e 45 miligramas de sais minerais. As terminações nervosas reagem ao estímulo erótico e promovem uma reação em cadeia. Ao mesmo tempo, as células olfativas do nariz – mais próximas da boca – permitem tocar, cheirar e degustar o outro.

OLFATO

O amor não começa quando os olhares se encontram, mas sim um pouco mais embaixo, no nariz. "Há circuitos que vão do olfato até o cérebro e levam uma mensagem muito clara: sexo", explica Maria Rosa García Medina, especialista em sentidos químicos do Laboratório de Pesquisas Sensoriais do Conselho Nacional de Pesquisas Científicas e Técnicas (Conicet), da Argentina.

Alguns pesquisadores afirmam que exalamos continuamente, pelos bilhões de poros na pele e até mesmo pelo hálito, produtos químicos voláteis chamados ferormônios.

Estudos têm demonstrado que a maior parte das espécies de vertebrados tem um órgão situado na cavidade nasal denominado órgão vomeronasal (OVN). A finalidade do OVN parece ser exclusivamente a de detectar sinais químicos – os ferormônios - envolvidos no comportamento sexual e de marcação de território.

Atualmente, existem evidências intrigantes e controvertidas de que os seres humanos podem se comunicar com sinais bioquímicos inconscientes. Os que defendem a existência dos ferormônios baseiam-se em evidências mostrando a presença e a utilização de ferormônios por espécies tão diversas como borboletas, formigas, lobos, elefantes e pequenos símios. Os ferormônios podem sinalizar interesses sexuais, situações de perigo e outros.

Os defensores da Teoria dos Ferormônios vão ainda mais longe: dizem que o "amor à primeira vista" é a maior prova da existência destas substâncias controvertidas. Os ferormônios – atestam – produzem reações químicas que resultam em sensações prazerosas. À medida em que vamos nos tornando dependentes, a cada ausência mais prolongada nos dizemos "apaixonados" – a ansiedade da paixão, então, seria o sintoma mais pertinente da Síndrome de Abstinência de Ferormônios.

Com ou sem ferormônios, é fato que a sensação de "amor à primeira vista" relaciona-se significativamente a grandes quantidades de feniletilamina, dopamina e norepinefrina no organismo. E voltamos à questão inicial: até que ponto a paixão é simplesmente uma reação química?

Um tradicional exemplo do estreito vínculo entre olfato e desejo é a síndrome de Kalman, um quadro genético de alteração hormonal que prejudica a puberdade e que está acompanhado por uma ausência congênita do olfato. Com a ajuda de tratamento, esses pacientes chegam a ter níveis normais de hormônios, mas não recuperam o olfato e isso têm efeitos diretos em sua vida afetiva.

O laboratório canadense Pheromone Sciences Corp. isolou e caracterizou os diversos ferormônios extraídos do suor. Uma primeira pesquisa revelou que o composto pode estimular a libido em homens e mulheres. Os pesquisadores esperam que, em um futuro não muito distante, esse derivado de ferormônios possa servir como tratamento efetivo e seguro para determinadas disfunções sexuais. Inclusive como complemento de remédios como o Viagra.

"Alguns derivados dos ferormônios já são usados para casos de frigidez feminina e ajudam na primeira etapa da sexualidade, que é o desejo", afirma García Medina. "Isso pode ter um grande potencial em outros tipos de disfunções sexuais, mas ao mesmo tempo, reacende questões éticas: É lícito interferir dessa forma no comportamento de uma pessoa?"

Não há duas pessoas que possuam exatamente o mesmo cheiro, embora haja algumas semelhanças entre membros de uma mesma etnia. O odor corporal é fortemente influenciado pelo tipo de alimentação e influencia nossas preferências por certos aromas. Pessoas que gostam de comidas muito temperadas também preferem fragrâncias fortes e penetrantes, como as que contêm patchuli, sândalo ou gengibre. Aquelas que consomem mais laticínios preferem fragrâncias florais, como lavanda e néroli (flor de laranjeira). A alimentação branda porém saudável dos japoneses, baseada principalmente em peixes, verduras e arroz, em conjunto com os banhos freqüentes e meticulosos, é uma das razões pelas quais seu odor corporal é praticamente inexistente, ao menos para o olfato de outras etnias. Os japoneses são atraídos por fragrâncias delicadas. E, enquanto os esquimós são tidos como tendo cheiro de peixe e os africanos cheiro de amoníaco, o resto do mundo concorda que o cheiro azedo dos europeus é o mais nauseante (neste caso não seria pela conhecida carência de banho?).

Há duas décadas atrás, cientistas europeus conseguiram reproduzir os ferormônios em laboratório. Alguns anos mais tarde, empresários americanos compraram a fórmula, fabricaram o produto em quantidades industriais e o engarrafaram em belos vidrinhos. Agora, os tais ferormônios estão à venda na Internet. O representante brasileiro do perfume americano The Scent promete: "É garantido! Você vai conquistar a mulher dos seus sonhos pelo cheiro". No site da empresa, o extrato de ferormônios é promovido como um "afrodisíaco natural", uma "química revolucionária", um "grande segredo vindo da natureza"; em síntese: "um estimulante sexual da mulher", que foi "inteligentemente mascarado como uma colônia masculina". Segundo seus fabricantes, este produto mágico age diretamente no subconsciente da mulher, despertando seu desejo sexual sem que ela saiba o porquê de se sentir loucamente atraída pelo galã perfumado. Mesmo sem explicações válidas, o site jura que "ela ficará totalmente a sua mercê". Ficou curioso? As belas promessas continuam: "você usa, é invisível, não tem cheiro, ninguém ficará sabendo, só você. É a ciência médica interferindo na nossa vida sexual, uma arma que ajudará nas suas conquistas". Segundo os responsáveis pelo produto, o sujeito que utilizar a poderosa colônia atrairá todos os olhares femininos, gerando "mais contatos imediatos e, sem dúvida, uma vida sexual mais ativa do que poderia um dia imaginar, não importa a sua aparência, não importa o nível social. Onde quer que você esteja, passará a chamar muita atenção, como um imã". Mas será que funcionam mesmo? Como você já deve ter percebido, o mesmo perfume ou loção após a barba, exala diversos cheiros em diferentes pessoas, especialmente naquelas do sexo oposto. À medida que a fragrância vaporiza e interage com nossa química própria, várias mudanças do aroma tornam-se perceptíveis.

Finalizando

Apesar de todas as pesquisas e descobertas, existe no ar uma sensação de que a evolução, por algum motivo, deu-se no sentido de que o amor não-associado à procriação surgisse – calcula-se que isto se deu há aproximadamente 10.000 anos. Os homens passaram realmente a amar as mulheres, e algumas destas passaram a olhar os homens como algo mais além de máquinas de proteção.

A despeito de todos os tubos de ensaio de sofisticados laboratórios e reações químicas e moléculas citoplasmáticas, afinal, deve haver algo mais entre o céu e a terra...

De qualquer forma, quando decidimos que temos química com alguém, o mais provável é que estejamos literalmente certos.

VOCÊ SABIA ???

1- Que o odor no homem é mais intenso que na mulher? Suas glândulas são mais ativas, fazendo com que “eles” transpirem duas vezes mais.

2- Que na etnia negra as glândulas sudoríparas são mais ativas para compensar o calor, mantendo a temperatura ideal do corpo?

3- Que o alho e a cebola interferem no odor da transpiração?

Para saber mais sobre o órgão vomeronasal leia: “O órgão vomeronasal e a atração sexual”.

terça-feira, 5 de abril de 2011

O OLHAR DA PSICOLOGIA : O QUE É o AMOR???


Todos sabemos o que é o amor, não sendo, no entanto, pelo menos para mim, possível defini-lo por palavras… Mas afinal o que será este sentimento (se o for) que nos torna parcialmente dependentes das pessoas que nos são mais próximas (e que amamos), ao ponto de, ao estarmos longe delas, nos tornemos altamente infelizes e angustiosos?



Robert Stenberg, psicólogo norte-americano, formulou uma teoria segundo a qual o amor englobaria três componentes distintas: a intimidade, a paixão e o compromisso. No que toca à intimidade, de carácter mais emocional, estamos perante uma relação de confiança mútua que inclui a protecção e a necessidade de estarmos perto do outro. É através da intimidade que duas pessoas compartilham as suas experiências pessoais e o que mais íntimo há de si. A paixão, que se baseia essencialmente na atracção sexual, envolve umsentimento irreprimível de estar com o outro. Por sua vez, o compromisso é a expectativa de que o relacionamento dure para sempre, numa intenção de comprometimento mútuo.






Na Psicologia, o amor é definido como sendo, não simplesmente o gostar em maior quantidade, mas sim um estado psicológico qualitativamente diferente. Istoporque, "ao contrário do gostar, o amor inclui elementos de paixão, proximidade, fascinação, exclusividade, desejo sexual e uma preocupação intensa."



Psicologismos à parte, o que será, entre nós, sabedores do senso-comum, o amor? Será uma mistura entre loucura e paixão que faz focar o nosso pensamento única e exclusivamente na pessoa que amamos? Ou será um sentimento de desejo incontrolável que nos torna incessantemente ansiosos por estar com o outro, numa troca recíproca de carinho, afecto, confidências, palavras e olhares? De facto, o amor pode ser uma conjugação de todos estes aspectos, em que nenhum é dispensável mas todos são imprescindíveis.


Numa tentativa de simplificar a definição de Amor, os psicólogos sociais recorreram à definição de seis diferentes formas de amar. São elas seis: o amor romântico(envolve paixão, unidade e atracção sexual mais usual na adolescência), o amor possessivo(determinado pelo ciúme, provocando emoções extremas), ocooperativo (que nasce geralmente de uma amizade anterior, sendo alimentado por hábitos e interesses comuns), o amor pragmático (característico de pessoas ensinadas a reprimir os seus sentimentos o mais possível, sendo estas relações desprovidas de qualquer manifestação de carinho), o lúdico (que se baseia na conquista e na procura de emoções passageiras) e oamor altruísta (praticado por pessoas dispostas a anular-se perante o outro, tendendo a "isolar-se num mundo onde, na sua imaginação, só cabem os dois ainda que o outro pense e actue exactamente ao contrário").



Há quem defenda que o amor é uma história construída ao longo da vida que, com o tempo, transpõe a mera atracção física, passando para uma preocupação com o bem-estar do outro para o seu próprio bem-estar. Manifesta-se numa influência mútua, no qual a (in) felicidade de um causa a (in) felicidade do outro. A paixão e o desejo tendem a não ser tão intensos, fortalecendo-se antes a cumplicidade, a intimidade e ocompanheirismo.

Durante a minha pesquisa, e na tentativa de explicar o que é ou em que se baseia o amor, descobri um estudo que revelou que os sentimentos amorosos podem levar à inibição da actividade de várias áreas do cérebro ligadas à capacidade e ao pensamento crítico, suprimindo a actividade neurológica relacionada com a avaliação social crítica dos outros, e também as emoções negativas. Este facto acaba, curiosamente, por fazer jus aoditado popular que afirma que "o amor é cego."



De facto, este estado leva a uma alteração da nossa capacidade cognitiva: tendemos a idealizar o parceiro, exagerando nas suas qualidades e rejeitando todo o tipo de indícios menos positivos que dele possam surgir.



Ainda no mesmo estudo, outro aspecto que terá impressionado os investigadores foi o facto de, ao analisarem a actividade cerebral de 20 jovens mães ao verem as fotos dos seus filhos, de crianças que conheciam e de amigos adultos, terem verificado que, tal como nos padrões de actividade cerebral registados num estudo relativo aos efeitos do amor romântico, ocorre uma redução dos níveis de actividade nos sistemas necessários para fazer julgamentos negativos.

Apesar de todos estes dados, imprescindíveis para o conhecimento do amor, qualquer definição que nos seja apresentada nunca nos satisfaz completamente. Sentimos que existe sempre mais alguma coisa e é esse mesmo mistério que torna a definição do amor subjectiva e, por isso, controversa e não consensual. Até porque, se tal fosse possível, a magia envolta em torno desse elemento fundamental da vida de um indivíduo poderia desaparecer, perdendo assim parte de todo o seu significado…



"Alguns dos obstáculos a amar: a nossa agenda pessoal ou motivações, expectativas, necessidades e desejos. Temos que ter cuidado para que no amor não estejamos a procurar a nossa pessoa, uma réplica, um clone; ninguém pode ser exactamente como nós. O amor pode ajudar-nos a descobrir as nossas diferenças de modo que possamos enriquecer-nos por elas."

Martine Batchelor